
“Somos seres sociais por natureza, mas desaprendemos a conviver”, resume a psicóloga Suzy Tiberly, especialista em Saúde da Família, ao explicar por que o isolamento deixou de ser fenômeno individual para se tornar emergência de saúde pública. Em entrevista ao Podcast Piauí Hoje, ela fala da pandemia da solidão, lembrando que o distanciamento já vinha crescendo antes da Covid-19 e passou a preocupar ainda mais com dois anos de confinamento.
“As pessoas perderam a prática de criar vínculos. Hoje relatam fobia social, ataques de pânico e dificuldade até para conversar olho no olho”. Esse diagnóstico de Tiberly é reforçado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Em 2024, a entidade criou a Comissão para a Conexão Social e classificou solidão e isolamento como “ameaças globais à saúde”, equiparando seus impactos aos dos grandes fatores de risco crônicos.
Estudos reforçam a gravidade: meta-análise publicada na PLOS Medicine mostra que relações frágeis aumentam em 50% o risco de morte prematura. Nos Estados Unidos, o cirurgião-geral Vivek Murthy calcula que os efeitos fisiológicos de estar só equivalem a fumar 15 cigarros por dia.
Segundo Tiberly, o problema não se limita à saúde mental. “A OMS já relaciona solidão a infarto, AVC, declínio cognitivo e queda da imunidade. É um círculo vicioso que enfraquece corpo e mente”, diz. Estudos associam isolamento a aumento de at32% % no risco de acidente vascular cerebral. Entre os grupos mais vulneráveis, ela destaca que todas as faixas etárias estão em risco. Dos adolescentes hiperconectados ao idoso que perdeu a rede de apoio: todos expostos a telas 24 h, mas com a “bateria social” descarregada.
Curiosamente, o esgotamento digital tem impulsionado o resgate do analógico. Livros de colorir, quebra-cabeças e jogos de tabuleiro voltaram às prateleiras como antídotos contra a tela permanente. A psicóloga cita ainda os grupos de corrida que se organizam nas redes apenas para se encontrar fora delas: “É um uso virtuoso da tecnologia: conectar on-line para reunir off-line”.
A especialista defende políticas públicas que recriem espaços de convivência, como grupos de dança, oficinas de arte, clubes de bairro e prescrição social dentro do SUS. “Solidão tem tratamento, mas começa com o primeiro passo: reconhecer que precisamos do outro para permanecer saudáveis.”