
É isso mesmo que você está lendo: por muito pouco, não matei a Benedita da Silva, deputada federal carioca que desperta admiração dentro e fora do país, tanto pela origem humilde, filha de pedreiro e lavadeira, quanto pelo ativismo político, defendendo pautas sociais e feministas. Sem falar ainda por ter sido a primeira senadora negra do senado brasileiro, bem como governadora do Rio de Janeiro. Conhecida por Bené, trabalhou como faxineira e vendedora (de limões e amendoins) pelas ruas do Leme. Devido a sua atuação combativa na favela Chapéu-Mangueira, foi eleita vereadora em 1982, pelo Partido dos Trabalhadores.
O fato mencionado ocorreu nos anos 1990, provavelmente em 1992 ou 1994, quando retornávamos de Floriano a Teresina. Havíamos ido à Princesinha do Sul, naquele dia, reforçar a campanha do candidato do PT, Dr. Tatá, à prefeitura da cidade. A disputa estava acirrada, por isso a presença de um nome de peso na reta final. Bené já era conhecida nacionalmente, sobretudo, em solo piauiense. Um número expressivo de eleitores florianenses, atraído pela estrela petista, compareceu ao comício. Dona de um vozeirão sem igual, ela não só arrancou muitos aplausos como tocou fundo o coração do público. Depois do ato, fomos todos saborear uns deliciosos pratos e trocar impressões sobre o estrondoso sucesso do evento.
Com voo marcado para o dia seguinte, cedinho da manhã, tivemos que retornar tardão da noite com a Benedita da Silva, apesar da canseira toda, bom frisar, no corpo e na mente. Sem dinheiro na época, pra bancar motorista, o jeito era a gente revezar na condução do Voyage. Na direção do carro, ia Nazareno Fonteles, petista dos mais respeitados do Piauí; no banco do carona, a deputada Benedita da Silva, que mal sentou, já foi dormindo; atrás, Ribamar Santos, figura histórica do PT; e euzim aqui, militante antigo da agremiação. Até aí tudo bem, não fosse o Nazareno me pedir que o substituísse por estar com sono.
O diacho é que o percurso entre Floriano e Amarante, de quase 90 km, tem muitas retas que, independente da boa vontade do motorista, acabam dando uma sonolência danada em quem dirige. Isso já ocorre durante o dia, imagina em plena madrugada, sem movimento na estrada e contando apenas com o silêncio da lua. Não deu outra, logo o sono me apareceu com seus dentes afiados. Nessas horas, costumo morder as mãos e pedir proteção ao anjo da guarda, que, ouvindo minhas preces, nos conduziu à terra natal de Da Costa e Silva, nosso poeta maior. Num quiosque de lá, tomamos um café no capricho, recobramos as forças e, conduzidos novamente por Nazareno Fonteles, chegamos sãos e salvos a Teresina. Ainda bem, pois não gostaria de ter passado à história como o algoz da Bené, essa mulher que orgulha o Brasil e o mundo por sua liderança popular.
