Proa & Prosa

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Roxas paixões

Mas são vários os casarões ali cujas janelas e portas se contam, às dúzias.

Por Fonseca Neto

Domingo - 21/04/2024 às 20:21



Foto: El Pais - El País Oeiras
Oeiras

A velhacap do Piauí não achou o que fazer e agora deu para mostrar suas meninas nas janelas de seu casario erado. Meninas feitas com a “argila da memória” de genuína brejeirice.

Houve até romeiros este ano que ficaram olhando “as moças” em vez de subir para a colina do Rosário durante a “fuga” com Bom Jesus. Muita gente tirando “casquinha-selfa” com elas no casarão vitoriano das 12 janelas. Curiosidades oeirenses. Aliás, não é de agora que o poeta Elmar as tem na cabeça. “Da casa de doze janelas / doze donzelas me espiam com olhares / que são setas de medo que / assustam e extasiam.”

Andar por uma cidade tal Oeiras, antiga nos padrões brasileiras, confere ao andante ver de tudo aquilo que suas marcas acumuladas exprimem; aquilo que acumulou, e segue acumulando, no passo e compasso do tempo. Essa das moças “da casa das doze janelas” é a imaginária poética da cidade movendo seus transeuntes e um jeito agradável de contatar a dita casa, real, edificada num dos cantos da praça da Vitória, hoje sede do Instituto Histórico de Oeiras, com os auspícios da Secretaria Municipal de Cultura.

Mas são vários os casarões ali cujas janelas e portas se contam, às dúzias. Há outra casa famosa, além de graciosa, de exatas doze janelas, no largo da igreja de Nossa Senhora da Conceição dos Homens Pardos, muito conhecida também por ser a morada de famoso coronel-prefeito do passado. E pai e avô de muitas moças bonitas.

Numa Semana Santa, antecedida pela grande procissão na Sexta de Passos, a invicta Oeiras se move em histórias, celebrações venerandas e atualiza o andar levando o Andor. De fato, leva-se em rito processional imagens e outros símbolos da catolicidade reiterada nos modos do povo do lugar, já aqui, nestas páginas, tantas vezes referidas. E a cada ano repetindo-se o caminho sacro com os pés das gerações que nascem e se sucedem.

A geração atual escreveu mais uma página dessas, na sexta-feira, 22 de março. Já na noite anterior, a cidade se mobilizara numa liturgia igualmente processional – “da Fugida” –, como ali é referida e representada a cena tantas vezes narrada do aprisionamento de Jesus, agora sua imagem, ali, ritual e contritamente guardada pela comunidade rosariana e muitos promesseiros.

Vindos de todos os pontos do vale do Canindé e arredores mais largos, a cidade vai ficando repleta de romeiros, isto é, de oeiros andantes em roxos sinais. Manhã chuvosa no sertão, Oeiras lavada e muitos assim de roupas molhadas, e espírito ardente, recitam o Ofício do Bom Jesus, ao meio-dia em ponto, e cantam as ladainhas do seu martírio. Antes da procissão se rezará uma vez mais o Terço e pouco mais depois sai a procissão.

Multidão enche o Largo do Rosário, de centenárias histórias! Da porta central da Matriz, mãos da tradição abrem sobre os fiéis um estandarte para iniciar o cortejo, nele inscrito, o S.P.Q.R. da República de Roma. Grande estandarte em veludo roxo com apliques de letras e auréolas feitas de ouro aparente. A orquestra faz o rufo primal, após o Miserere e o Canto de Verônica. Move-se a procissão qual um rio de gente a se derramar pelos poros vivos da cidade.

E novo ajuntamento desses milhares à praça da Senhora da Vitória, coração de Oeiras, palco das sagrações católicas do lugar e dos seus rituais de vida política desde as fundações da institucionalidade sob a ordem lusa. Houve quem calculasse cerca de 40 mil pessoas no momento do Sermão do Encontro, este ano feito pelo bispo de São Raimundo Nonato, dom Ronilton Souza de Araújo, uma fala apropriada, além da inspiração no fundamento do amor cristão essencial.

Seguiram todos ao próximo Passo e aos passeios na cidade monumento nacional do Brasil.

Fonseca Neto

Fonseca Neto

FONSECA NETO, professor, articulista, advogado. Maranhense por natural e piauiense por querer de legítima lei. Formação acadêmica em História, Direito e Ciências Sociais. Doutorado em Políticas Públicas. Da Academia Piauiense de Letras, na Cadeira 1. Das Academias de Passagem Franca e Pastos Bons. Do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí.
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