Blog do Brandão

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Na cegueira da ignorância é preciso mostrar que estudar é um ato revolucionário

A pessoa ignorante, nesse novo paradigma, é muitas vezes uma vítima de um sistema perverso e por isso não consegue enxergar sua ignorância

Por Luiz Brandão

Sexta - 05/12/2025 às 08:59



Foto: Divulgação A cegueira da ignorância é uma arma contra a humanidade
A cegueira da ignorância é uma arma contra a humanidade

Volto ao tema da força da ignorância no Brasil nos últimos anos para reafirmar que estudar é um ato revolucionário. Em um contexto onde a desinformação é industrializada e a ignorância é politicamente instrumentalizada, buscar conhecimento transcende o âmbito pessoal e torna-se uma resistência. A ignorância não é mais apenas uma lacuna individual; é um produto manufaturado, distribuído em larga escala por máquinas de propaganda que lucram com a confusão e o ódio. No Brasil, esse fenômeno encontrou um ecossistema fértil no bolsonarismo e em setores da extrema direita, que transformaram a rejeição à ciência e ao conhecimento em plataforma política.

A pessoa ignorante, nesse novo paradigma, é muitas vezes uma vítima de um sistema perverso. Ela é diariamente bombardeada por uma rede de fake news que a convence de que estudar é "coisa de esquerdista", que universidades são "fábricas de marxismo cultural" e que especialistas são parte de uma "elite globalista" conspiratória. Essa campanha não nega apenas fatos; nega a própria ideia de verdade objetiva. A régua do ignorante foi agora calibrada por algoritmos de redes sociais e grupos de WhatsApp, criando uma realidade paralela onde a credibilidade é medida pela lealdade ideológica e não pela veracidade dos fatos.

Os males dessa ignorância alimentada são profundamente destrutivos. Ela foi a força motriz por trás do negacionismo pandêmico que teve consequências catastróficas. A campanha contra as vacinas, liderada e estimulada por figuras-chave do governo Bolsonaro e seus apoiadores, promoveu tratamentos ineficazes, desacreditou máscaras e isolamento social, e semeou dúvidas sobre um instrumento de saúde pública salvador. O resultado foi um dos maiores erros sanitários de nossa história: centenas de milhares de mortes que poderiam ter sido evitadas, um legado trágico da política que elevou a ignorância à condição de diretriz de Estado.

Na esfera política, essa cegueira fabricada criou um eleitorado não apenas desinformado, mas ativamente hostil à informação. A escolha de "estúpidos para cargos de comando" deixou de ser um acidente para se tornar uma estratégia. Líderes incompetentes e agressivos são protegidos por um escudo de pós-verdade: qualquer fato que os desacredite é imediatamente enquadrado como "notícia falsa da grande mídia". 

Ataques sistemáticos às instituições educacionais e de pesquisa, aos veículos de imprensa e aos dados oficiais, como os do IBGE e do INPE, buscavam demolir as fontes de conhecimento que poderiam contestar a narrativa oficial da ignorância. O objetivo era claro: enfraquecer os pilares da razão pública para que apenas uma voz, a do líder e de seus propagandistas, fosse considerada confiável.

Socialmente, essa dinâmica aprofundou fraturas e alimentou a violência. A negação do "lado sociológico, econômico e psicológico" das comunidades transformou-se em discurso de ódio estruturado. Minorias, movimentos sociais, povos indígenas e comunidades tradicionais foram tratados não como partes legítimas da sociedade com demandas complexas, mas como "inimigos" a serem combatidos. A ignorância, aqui, vestiu a armadura do preconceito e pega em armas, literal e figurativamente.

Portanto, combater a ignorância no Brasil contemporâneo exige mais do que defender a educação de maneira abstrata. Exige desmontar uma máquina de produção de estupidez. É necessário expor as arquiteturas das fake news, responsabilizar os agentes que as financiam e disseminam, e promover uma educação midiática crítica que ensine as pessoas a identificar a manipulação. As plataformas de redes sociais, usadas como vetores principais dessa desinformação, devem ser reguladas e cobradas.

Tenhamos pena do ignorante manipulado, sim, pois ele é um instrumento e uma vítima. Mas nossa ação deve ser direcionada contra os arquitetos dessa cegueira em massa. O antídoto é duplo: conhecimento e vigilância democrática. É preciso estudar com mais afinco, apoiar a ciência brasileira, valorizar o jornalismo profissional e, sobretudo, nunca baixar a guarda contra aqueles que veem na ignorância do povo a base do seu poder. A luz do saber é a maior inimiga de quem prospera na escuridão. Defender essa luz não é apenas um ato intelectual; é um imperativo cívico para a reconstrução do país.

Luiz Brandão

Luiz Brandão

Luiz Brandão é jornalista formado pela Universidade Federal do Piauí. Está na profissão há 40 anos. Já trabalhou em rádios, TVs e jornais. Foi repórter das rádios Difusora, Poty e das TVs Timon, Antares e Meio Norte. Também foi repórter dos jornais O Dia, Jornal da Manhã, O Estado, Diário do Povo e Correio do Piauí. Foi editor chefe dos jornais Correio do Piauí, O Estado e Diário do Povo. Também foi colunista do Jornal Meio Norte. Atualmente é diretor de jornalismo e colunista do portal www.piauihoje.com.
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